Crime de violação: acima de tudo é preciso apresentar queixa

Em Portugal, o crime de violação ainda é um crime silencioso. Trata-se de um crime semi-público e como tal dependente da apresentação de queixa por parte da vítima, mas muitas vezes a vergonha acaba por falar mais alto e quem passa por estas situações acaba por nada fazer.

Estima-se que apenas cerca de 46% destes crimes foram dados a conhecer ao público, através de apresentação de queixa, segundo dados da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV) de 2013 a 2015.  Durante este mesmo período, foram registados um total de 1799 casos, tendo-se verificado um aumento da prática deste crime ao longo dos anos, como mostra o gráfico.

Em Portalegre não há nenhuma associação específica que trate destes casos em particular. No entanto, as vítimas podem deslocar-se a qualquer entidade policial ou médica a fim de analisar o caso e tomar as medidas necessárias. Todas estas entidades funcionam em rede e basta ser acionado um dos pontos.

Otávio Tavares, do Núcleo de Apoio à Vítima da GNR Portalegre, explica como funcionam estes processo a partir do momento em que é apresentada queixa. “Primeiramente é contactada a Polícia Judiciária e é feito o relato, depois é dada uma série de conselhos às pessoas que passa por não tomarem banho, recolher algumas peças de vestuário. Depois são encaminhadas logo de imediato para o Gabinete Médico-Legal para fazerem a recolha de vestígios”.

Apesar de se tratar de um crime com alguma incidência, a sua denúncia é muito difícil como explica Otávio Tavares. “Por vezes todo o processo que se desenrola na violação, ou no processo crime que se desenrola em consequência da violação, vai provocar uma dupla e tripla vitimização em quem sofre”.

Segundo dados da APAV, a esmagadora maioria das vítimas são do sexo feminino (foi registado que em 92,5% dos casos eram mulheres), já do lado do agressor, a maioria é do sexo masculino (94% das situações).

Em grande parte destas situações, as vítimas já conhecem de alguma forma o autor do  crime, sendo que maioritarimente acontecem entre cônjugues (219 casos em 2015), com o companheiro (91 casos em 2015) e em que a vítima é o próprio filho ou filha do agressor (43 casos em 2015). Otávio Tavares, esclarece que “98% das violações que acontecem em Portugal acontecem no seio da conjugalidade, acontecem entre marido e mulher, pois a prova é muito mais difícil, ou entre familiares muito próximos”.

Relativamente à faixa etária, tanto das vítimas como dos agressores, a mesma é semelhante e situa-se entre os 36 e os 45 anos como mostra o seguinte gráfico.

Uma das grandes dificuldades no crime de violação prende-se com o facto de ser ou não possível a recolha de provas ou, no caso de serem recolhidas, se são lícitas. O tempo máximo para a recolha possível de vestígios é de 72 horas e nem sempre se consegue fazer esse procedimento. “O que é que acontece nestes crimes de violação normalmente? Diz a minha experiência que a vítima sente-se conspurcada e a primeira coisa que quer fazer é lavar-se e lavar a sua imagem e meter a roupa para lavar porque sente que foi violentada”, explica Otávio Tavares que alerta para o facto de este procedimento, embora compreensível, poder afetar o trabalho de investigação.

Neste tipo de crimes, assinala Otávio Tavares, em causa não está apenas a parte penal, mas também, danos psicológicos.

 

Autor: Catarina Belinho

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