Rede de cuidados continuados insuficiente no Alentejo

O aumento de 19% no número de unidades de cuidados continuados por todo o país parece não ser o suficiente, o número de camas disponíveis por mil habitantes é ainda inferior às metas estabelecidas para a satisfação das necessidades de uma população cada vez mais envelhecida. Com o objetivo de alcançar as 14.640 camas, nem 50% da meta foi atingida.

No Alentejo a situação não é diferente, com apenas 38 unidades de internamento em toda a região, a resposta que é dada é insuficiente para satisfazer a crescente procura da população. Os casos mais problemáticos registam-se em unidades de cuidados paliativos e em unidades de convalescença, onde se identificou um baixo acesso que atinge os 81% e os 95%, respetivamente.

Muita procura, poucas respostas

Uma das cinco unidades de convalescença existentes no Alentejo encontra-se em Vila Viçosa. Com um investimento de cerca de 2,8 milhões de euros e com a comparticipação de 750 mil euros da Administração Regional de Saúde do Alentejo, a unidade de cuidados continuados abriu portas em maio de 2011 e desde então “constitui uma mais valia para o concelho e para o distrito de Évora”, diz Eduardo Almeida, presidente da delegação da Cruz Vermelha Portuguesa de Vila Viçosa.

Desde o início da sua atividade, a unidade já recebeu centenas de utentes, incluindo os 30 atuais que ocupam todas as camas disponíveis. Com uma procura cada vez maior por parte de uma população cada vez mais envelhecida, as vagas disponíveis são insuficientes e as listas de espera cada vez maiores.

Como afirma o responsável pela unidade: “É insuficiente, é sempre insuficiente porque infelizmente os problemas de saúde vão surgindo cada vez mais e é evidente que os hospitais começam a estar saturados e estas casas também não conseguem dar uma resposta para ir ao encontro da solicitação que os hospitais precisam.”

Dias que se prolongam

Um novo utente entra na unidade de cuidados continuados de Vila Viçosa. Outro sai. Aqui a rotatividade deve-se ao fato de os utentes só poderem permanecer, no mínimo, 30 dias na unidade de convalescença.

Para além do tempo que diferencia as unidades de cuidados continuados existentes, as unidades de convalescença prestam cuidados em regime de internamento, na sequência de internamento hospitalar ou de episódios de doença, em período de convalescença que requeira cuidados clínicos.

Desde pessoas com insuficiência cardíaca a paralisias depois de um AVC, são vários os casos presentes na unidade. A cuidar destes utentes está uma equipa multidisciplinar de 30 pessoas, que vai desde o médico, fisioterapeuta, terapeuta da fala, animadora sociocultural, entre outros.

Esquecer o que os trouxe

O mais importante não é o que os leva à unidade mas sim as pessoas. Desde o Senhor Pernas à Dona Quina, são vários os utentes que participam nas atividades desenvolvidas pela animadora sociocultural, Sofia Perico.

É tudo pensado ao pormenor para garantir que o ambiente estimula a recuperação dos utentes. Com o objetivo de ocuparem o tempo que ali passam, ou até mesmo “para esquecerem a doença e os problemas”, a animadora cria todas as semanas novas atividades para que estes não se esqueçam que ainda são úteis. Desde descascar maçãs até cozer botões, Sofia Perico aposta nas atividades de vida diária.

A estrela da unidade é a Dona Marília, entrou na unidade há dois meses e desde então que não para, presépios, decorações, arraiolos. A expressão plástica e a costura fazem parte da sua vida desde os três anos, e apesar das dificuldades serem cada vez maiores, estas atividades ocupam-lhe a maior parte do tempo.

Com a chegada do Natal, utentes e técnicos metem mãos à obra. Os biscoitos já foram preparados, está agora na hora de fazer os embrulhos. A unidade de cuidados continuados abriu portas às crianças que participam no programa de ocupação de tempos livres organizado pela Câmara Municipal de Vila Viçosa. Entre músicas e poemas de Natal, Sofia Perico emociona-se ao recordar os que por ali já passaram: “É realmente muito gratificante, e apesar do curto espaço de tempo criamos laços, há sempre aquelas pessoas que ficam no nosso coração.”

Mais do que palavras

Infelizmente, nem todos conseguem participar nas atividades da unidade, António Espada é um desses utentes, chegou apenas há uma semana mas as melhoras já são visíveis. Algumas palavras ainda ficam presas debaixo da língua, outras são trocadas, a escova vira espelho e a cadeira vira banco.

Uma alteração na comunicação causada por uma lesão cerebral na área da linguagem fez com que António se esquecesse do nome dos próprios filhos. Este é apenas um dos 12 casos acompanhados por Cátia Ambrósio, terapeuta da fala na unidade.

Apesar das alterações na comunicação serem as mais frequentes, a terapeuta fez um alerta para que outros problemas não caiam no esquecimento: “ Há muita gente que ainda não sabe mas o terapeuta da fala intervêm muito ao nível da mastigação e da deglutição que fica também muito afetada quando há lesões neurológicas.”

Apesar de passageira, a estadia destes utentes marca cada um dos técnicos da equipa multidisciplinar mesmo depois da sua saída. Com uma população cada vez mais envelhecida, prevê-se que no futuro o número de unidades existentes não consiga responder da forma mais eficiente às suas necessidades.

 

Autor: Marta P. Ramos

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