"Não trocava as ovelhas por nada deste mundo"

José Maria, Pastor
José Maria, Pastor [por Mara Alves]

A seca preocupa quem vive do pastoreio. José Maria anda atrás das ovelhas há quase seis décadas. Mesmo assim não pensa deixar o ofício de uma vida. Ele e o Sarilho que o segue há sete anos. O único lamento que tem é não saber ler nem escrever.

O relógio marca meio-dia. O sol já vai alto. O calor faz-se sentir de uma forma intensa, um calor impróprio para a época, mas típico da seca que se faz sentir em todo país. Em Mosteiros, no distrito de Portalegre, a planície alentejana encontra-se devastada pela seca que teima em continuar. José Maria, pastor há 58 anos, está preocupado.

Há muitos anos que anda com um rebanho e não se lembra de um ano como este. “Parece-me que um tempo tão ruim como este ano ainda não tinha aparecido”. O suor teima em escorre-lhe pelo rosto. As tentativas de o enxugar com o lenço de tecido que tira da algibeira, de nada valem. A temperatura está muito elevada.
Aproveitando a sombra de um chaparro, José Maria senta-se para petiscar um naco de pão, um pedaço de presunto e uma laranja.

Junto dele está o “Sarilho”. É o seu cão pastor. Tem pêlo grisalho de tom acastanhado, meio sujo, fruto da idade. O “Sarilho”não abandona o dono nem um só momento, é o seu amigo mais fiel, a sua única companhia. “Este cão anda comigo há sete anos. Tem sido a minha companhia”, lembra José Maria.

A solidão é a companhia a que este pastor já se habituou há muito tempo. Estar só já é um hábito, estranho é quando aparece alguém para conversar, porque aqui, todos os dias são iguais. Acorda-se e deita-se cedo. Faça chuva, faça sol.
Eram cinco da manhã quando José Maria se levantou. Desde sempre que é assim, o corpo de José Maria já se habituou a esta rotina de anos. “Nunca precisei de relógio levanto-me sempre de madrugada e até ao dia de hoje contam-se pelos dedos as vezes que me deixei dormir”.
Este homem nunca conheceu outra vida senão esta, a de andar atrás do rebanho. Os animais são o seu alento. “Gosto desta liberdade, de ouvir os chocalhos das ovelhas, de as ouvir a comer”.

Nunca aprendi a ler

Mas apesar do gosto por esta profissão, a vida de pastor não tem sido fácil para José Maria. Aos 7 anos de idade saiu de casa dos pais para ganhar o sustento e comprar o seu primeiro par de sapatos. Até hoje nunca mais parou.
“Já apanhei muita chuva e muito frio nesta vida, mas não trocava as ovelhas por nada deste mundo”.

Não sabe ler nem escrever, e essa é uma das frustrações da sua vida, diz com um ar emocionado. “Nunca aprendi a ler nem a escrever, tenho visto muitas escolas por fora, mas por dentro nunca vi nenhuma”. Um sonho de uma vida que o destino se encarregou de adiar, talvez para sempre. “Agora com esta idade já não tenho memória para aprender letras, o que é que se há-de fazer o destino quis assim”.