Crianças que não o são

Na Palestina carregam com armas e com bombas para um dia caírem desamparadas no chão e nunca mais se levantarem. Num país algures em África, ou até mesmo no Brasil, comem raízes e lama, comendo também do lixo, para durarem mais alguns dias em pé, enquanto que no país do Bush falecem gordas.

Não vou começar este texto com a palavra infelizmente, porque já começo a ficar um bocado cansado de estar sempre a referir a palavra infelizmente. Talvez o maior drama actual da sociedade seja os abusos que se comentem sobre as crianças. No dia em que se celebrou o Dia Mundial da criança, reflecti um pouco sobre o dia dos seres que alguém um dia disse, e cheio de razão, que são o melhor do mundo. Desfrutei ao ver as crianças brincar no seu dia. Gosto de as ver aprender na escola e riu-me quando fazem diabruras. Mas o que eu mais gosto é de as ver corar que nem um tomate quando vêem o adulto com cara de papão depois de saberem que foram apanhadas.

Como as crianças são ingénuas e, por isso, pecam de forma involuntária, o papão ameaça mas não bate. Era bom que fosse assim em toda a parte do mundo. Mas não é. Há crianças que não são crianças e, como tal, a realidade deve ser relembrada por mais dura que seja. Pois bem, em países do Terceiro Mundo as crianças não sabem o que é uma escola, um afecto, um brinquedo, um filme, uma música, tão-pouco uma sopa. Mas sabem o que é uma metralhadora, uma picareta, um corpo ferido e um estômago vazio.

No dia da criança houve um participante da Quinta das Celebridades que disse que tinha sido um drama o facto de ter sido nomeado. Antes, porém, ouvira dizer nas notícias que em Bombaim há crianças que trabalham 14 horas por dia, quiçá, para sustentar a família. Ali bem perto, há crianças a coser bolas de futebol para os futebolistas desempenharem a sua actividade. Na Palestina carregam com armas e com bombas para um dia caírem desamparadas no chão e nunca mais se levantarem. Num país algures em África, ou até mesmo no Brasil, comem raízes e lama, comendo também do lixo, para durarem mais alguns dias em pé, enquanto que no país do Bush falecem gordas. É o fundo do poço. Sem dúvida, a mais cruel forma de exclusão social que alguém pode sofrer. Passar fome é não ter renda suficiente sequer para cobrir uma das necessidades mais básicas do ser humano: comer. E a fome crónica provoca graves problemas à saúde, como o fraco desenvolvimento físico e intelectual do indivíduo.

Assim sendo, o Dia Mundial da criança não faz qualquer sentido, porque parece que vamos ter que continuar a viver continuamente assim, infe… Ups, já me esquecia.

Manuel Garcia -  Ex-aluno de Jornalismo da ESEP