Projectos ajudam a diminuir suicídio em Portalegre

Um colheu o nome de uma ave fabulosa, que renasce das cinzas, o outro refugiou-se na natureza em flor. Fénix e Lírio, respectivamente, são dois projectos centrados na prevenção do suicídio em Portalegre. Ambos já colheram frutos. Mas é preciso criar novas soluções.

“O suicídio entre os idosos apresenta um duplo paradoxo. Porquê terminar a vida tão próximo do fim? Porquê tanta pressa?” diz, citando alguns sociólogos, Érico Alves, director do Departamento de Psiquiatria e Saúde Mental do Hospital de Portalegre (DPSMHP).
O clínico tenta explicar a complexidade que envolve o tema do suicídio no Alentejo, que ocorre maioritariamente nas faixas idosas. “Nós entendemos que a problemática é multidimensional e que exige uma abordagem terapêutica polifacetada”, refere Érico Alves.

Portugal apresenta o padrão de suicídio mais idoso da Europa. Metade dos suicídios ocorrem após os 64 anos. No Alentejo este padrão é ainda mais idoso pois as taxas sobem após os 70 anos.

O que se observa é que com o aumento da idade, aumenta também o risco depressivo e a tendência para o suicídio.
São muitos os factores que podem justificar este padrão de suicidalidade. Do ponto de vista médico, a doença psiquiátrica, o alcoolismo, a doença física, a doença terminal e o próprio medo das doenças, constituem nas camadas mais envelhecidas factores de risco que podem conduzir ao suicídio.

Os próprios eventos de vida condicionam também a suicidalidade nos idosos. “Por exemplo, a morte do par conjugal, de parentes próximos, um divórcio, o internamento precipitado num lar de idosos ou psiquiátrico, superlotado e com um numero reduzido de funcionários”, enuncia o director.

“Os filhos vão para longe e eles [os idosos] ficam cá a envelhecer sozinhos, explica Érico Alves.
O suicídio é a causa de morte mais relacionada com a fragmentação social. “Portanto, do ponto de vista sociológico, quando existe uma suicidalidade elevada, como é o caso de Portalegre, não é só o indivíduo que está doente, toda a sociedade se encontra doente”, afirma o dirigente do DPSMHP.

Combate ao suicídio tem de ser colectivo

Há dezanove anos que Érico Alves trabalha neste departamento. Vindo do Brasil, confessa que no inicio lhe foi difícil entender a nova realidade com que se deparava. “Não estava habituado a viver numa sociedade em que as pessoas se matam. Porque no Brasil as pessoas matam outras pessoas. Não se matam.”
Para este departamento o combate ao suicídio tem de ser uma acto colectivo de toda a sociedade. O DPSMHP tem desenvolvido um trabalho de equipa contínuo, determinado, estratégico, voltado para a prevenção do suicídio na região. “Há dezanove anos que o nosso lema é prevenir o suicídio no Alentejo, nomeadamente em Portalegre”, refere Érico Alves.

É neste trabalho de equipa e de prevenção que se insere o projecto Fénix e o projecto Lírio.
O projecto Fénix, de uma maneira geral, abrange toda a estratégia de prevenção do suicídio e funciona com um médico, uma assistente social, uma terapêutica ocupacional e uma enfermeira.

Este projecto tem evoluído ao longo de dezanove anos e, para responder de uma maneira mais directa à elevada suicidadlidade nas camadas mais envelhecidas da população portalegrense, desdobrou-se noutro projecto.
“Neste momento, há uma desdobração do projecto Fénix, que é o projecto Lírio. O projecto Lírio é de prevenção do suicídio especificamente direccionado para o doente idoso”, afirma o director o DPSMHP.
Tanto o projecto Fénix como o projecto Lírio têm contribuído para a diminuição do suicídio em Portalegre. Actualmente o distrito ocupa o terceiro lugar no ranking nacional de suicidalidade, tendo descido do segundo lugar que anteriormente ocupava. Em primeiro lugar encontra-se o distrito de Beja e em segundo encontra-se o distrito de Faro.

Novas soluções

Hoje, os idosos constituem cerca de 30% dos que vivem abaixo da linha de pobreza e como refere Érico Alves, “constituem hoje um caso especial de exclusão social, de dependência física. Dai a necessidade de melhoria dos ordenados dos idosos para fazer face as suas necessidades básicas”.

Para toda a equipa do DPSMHP deveriam ser encontradas novas soluções que permitissem ao idoso viver com dignidade. “Deveriam ser criados programas de segurança social para extinguirem as manchas de pobreza social entre os idosos, deveria haver incentivos à aquisição cultural, a cursos de ginástica, de natação, de música, deveria haver facilidade de acesso a tratamentos termais”, sugere o director.

Mas estas sugestões não são inconscientes e denotam as limitações dos médicos neste combate. “Por mais abrangente que seja o nosso campo de actuação, nós médicos temos sempre os limites próprios dos condicionalismos socio-económicos e culturais existentes”

O suicídio é ainda um fenómeno preocupante e a mensagem que este departamento pretende passar é que toda a sociedade se envolva na sua prevenção.
“Melhor se prevenirá o suicídio do idoso com amor, do que com indiferença social”.