ESEPTV - Peças
03/02/2016 - 14:40
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A exclusão social é um problema que afecta, cada vez mais, as cidades portuguesas. Numa altura em que a Escola Superior de Educação de Portalegre promove o 1º colóquio sobre Serviço Social, no dia 29 de Abril, o ESEPJornal apresenta o caso do Centro de Acolhimento para os Sem – Abrigo de Portalegre.
Leite, pão, café, massa, arroz… As caixas vêm cheias. Todos colaboram na entrada daquilo que fará as refeições dos próximos meses. Os alimentos vêm da recolha feita pelo Banco Alimentar.
O Banco Alimentar encarrega-se de distribuir alimentos para todas as instituições que alojam quem mais precisa. Hoje é a vez do Centro de Acolhimento para os Sem – Abrigo. A despensa enche-se uma vez mais. O Centro de Acolhimento para os Sem – Abrigo de Portalegre (CASA) é uma instituição que funciona há seis anos e que hospeda dezoito daqueles que ficaram sem um tecto ou sem quatro paredes para viver. A rua levou tudo: família, amigos… A solidão é a companhia de todas as horas.
O CASA tem sempre as portas abertas para aqueles que querem mudar o rumo que a vida tomou. O dia-a-dia na instituição é variado. “ Temos pessoas dos 16 aos 80 anos, por isso, as actividades dos nossos utentes variam de situação para situação”, explica Antónia Chambel, directora do CASA.
Os mais jovens regressam aos estudos, os mais velhos descansam. O Alexandre Vaz trabalha na recolha do lixo da Câmara Municipal de Portalegre. “ Tenho uma vida bastante activa. Trabalho e gosto de colaborar com o CASA naquilo que precise”, diz. O Alexandre recuperou a alegria de viver e conseguiu dar a volta aos momentos maus da sua infância. Sempre viveu num orfanato e ainda frequentou a CERCI. Para ele, o CASA é a sua casa. “Gosto de estar aqui, com os meus amigos. Festejamos todas as festas”, refere.
A harmonia e a paz são as mais procuradas por todos aqueles que ali vivem. O quentinho do aquecedor da “salinha da televisão”, como lhe chamam, reconforta o corpo e a alma. Ali vive-se como se não houvesse ontem. O passado magoa. As memórias pesam no coração.
“Eles são como toda a gente: têm um lado bom e mau. Nós perdoamos-lhes tudo, porque gostamos muito deles. Temos muita confiança neles”, afirma Angelina Gordina, auxiliar dos serviços gerais do CASA.
O ambiente dentro da casa é verdadeiramente familiar. Lá, toda a gente se conhece e se trata por tu. As histórias das suas vidas são contadas sem rancor ou qualquer espécie de mágoa.
Luís Almeida passa os dias em casa ou a deambular pela cidade. Saiu de casa ainda muito jovem e recorreu ao Centro de Acolhimento para ter uma cama quente onde se deitar nas noites frias de Inverno.
“Gosto de tudo aqui! Encontrei boas amizades, quando preciso de um cigarro dão-me logo” diz Luís Almeida. Ao seu lado está Francisco Braga. Apesar da sua boa disposição, reconhecida por todos os colegas, fala com alguma tristeza, pois carrega ainda a dor da morte da sua filha há cerca de três meses.
“A minha filha tinha apenas 24 anos e morreu num acidente de viação”, diz emocionado. O “Chico”, como é conhecido em casa, separou-se da esposa e a vida arrastou-o para a rua. Hoje não tem contacto com a família, a não ser com o filho que o visita de vez em quando.
O Sucesso e a ruína
Apesar de serem apenas dezoito, os “inquilinos” desta casa são muito heterogéneos. Toxicodependência, alcoolismo, prostituição e esquizofrenia são os casos mais frequentes no CASA. Para Antónia Chambel, os casos mais difíceis de lidar são os doentes esquizofrénicos.
“Para mim, que trabalho nisto há 7 anos, não me surpreende nada que a maioria da problemática social que aqui temos esteja associada à doença mental, porque a pessoa passa por uma privação na vida tão violenta como passar fome, apanhar frio, dormir na rua, ser vítima de maus tratos e isso leva aos poucos a uma perturbação mental”, afirma a directora do Centro.
O CASA não fecha as portas a ninguém, que até chega mesmo a ter uma “cama de emergência” para o caso de haver mais uma entrada. Os casos de sucesso existem, mas não acontecem todos os dias e contam-se pelos dedos. Todos podem ser casos de sucesso, desde que haja esforço e vontade para um dia restituírem a sua autonomia e independência.
Apesar de ser difícil assumir, Antónia Chambel afirma, todavia, com tristeza que existem também casos perdidos e afirma que “há por vezes um não querer tão grande que chega a ser difícil explicar, e há pessoas que têm uma grande tendência de correr para o abismo e de fora cíclica: ora estão em cima, ora correm outra vez para baixo.”
Pedro Santos é um jovem com apenas 19 anos que, desde muito cedo, conheceu o lado amargo da vida. Antes de ir para o Centro de Acolhimento para os Sem – Abrigo, foi vítima de maus-tratos. Tem um passado ligado aos furtos e está, actualmente, em prisão domiciliária.
“Não vou poder sair destas quatro paredes durante oito meses, tenho de estar aqui fechado”, diz Pedro. O arrependimento está sempre presente na cabeça de Pedro. “ Espero nunca mais roubar, tive muita sorte em não ir para a prisão e fico contente por ainda aqui estar”, refere Pedro, enquanto desvia os olhos para o chão.
“Andei durante dois meses a dormir na rua, ao frio e à chuva. Tinha fome, tinha que comer”, diz com dureza no olhar. Sem sonhos, nem projectos Pedro apenas deseja que a situação mude daqui para a frente, afirmando que “ o tempo há – de passar e depois logo se vê”.
Mesmo ao seu lado, Hugo Paiva acompanha a conversa ao mesmo tempo que joga, atenciosamente, Playstation. São os melhores amigos e andam sempre juntos. Hugo foi parar ao CASA devido à pobreza com que vivia com a mãe. Não tinha água nem luz. Assim não dava para viver”, refere o jovem. Hugo já foi expulso uma vez, mas diz que “ a doutora como é boa pessoa perdoou-me”.
Uma responsabilidade de todos
O CASA faz parte da rede social da Câmara Municipal de Portalegre. Os apoios facultados são, maioritariamente, financeiros. Mata Cáceres, presidente da Câmara Municipal de Portalegre mostra-se muito satisfeito com o trabalho desenvolvido. “ Eu penso que estes trabalhos são sempre muito importantes quando são conseguidos e quando conseguem cumprir o seu propósito. O CASA está a fazer um excelente trabalho”, explica o presidente da Câmara. Lutar contra as adversidades, as injustiças e os preconceitos continua a ser o principal objectivo de instituições como o CASA. “ No início, refugiava-me e chorava bastante devido às situações que existiam. É muito triste vermos que pessoas de carne e osso, como nós, sofrem tanto nesta vida. É tão injusto!”, refere, por fim, Antónia Chambel.
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